sexta-feira, 8 de junho de 2012

Um fim de tarde cinza para uma alma cinzenta.


Era início de noite, por volta das dezoito horas. O céu, cinzento, com leves manchas brancas das nuvens distribuídas no ar, parecia pesado depois de um dia inteiro de trabalho. Aos poucos, uma estrela e outra despontavam no infinito, trazendo algum brilho para a noite que estava chegando. Mesmo assim o céu era pesado.
O ar da capital é sempre desse jeito durante a semana. Parece até mesmo que respirar é mais difícil, porque todos os gases acima da cabeça exercem uma pressão enorme nos pulmões e na mente. Nos finais de semana, o ar não é tão pesado, mas, se não tomar cuidado, pode ser pior do que nos dias de trabalho. É que se não se aprende a lidar com a pressão, a diferença entre uma quinta-feira e um sábado pode trazer sérios problemas aos pulmões e à mente.
Naquele fim de tarde, ao passar pela Esplanada dos Ministérios, depois de um dia inteiro de trabalho, tudo parecia tão comum, que não fazia sentido tantos turistas tirando fotos pelas redondezas. Não havia razões para fotos, nem para passeios, nem para turistas. Era apenas mais um dia na capital. Um dia de trabalho. Um dia de semana: terça-feira.
Da janela do ônibus, era possível contemplar o céu, pesado, do lado de fora. Acima dos prédios, dos ministérios, do Congresso; ele apresentava-se na sua forma mais cinzenta do dia. A sua forma mais pesada sentida.
Não que o fato de ser cinza implique em que seja pesado. Há pessoas para as quais essa massa de ar cinzenta sequer é notada. Mas, nesse dia, para esse sujeito, o céu e o ar eram cinzentos e pesados. Na verdade, o céu e o ar são a mesma coisa: não é possível tocar o céu, tampouco o ar, então, por aproximação, os dois são a mesma coisa.
Passando pelos prédios dos Ministérios, observando o trânsito caótico desse horário, estava ele ali, sentado no último assento do lado direito daquele ônibus, tentando respirar. O trabalho lhe sufocara. Por isso, o céu estava tão pesado. A pressão que exercia causava-lhe certa vertigem, fazendo-o delirar por uns milésimos de instantes. Caramba! Que dia!
As terças-feiras não costumam mesmo ser muito leves, mas, é bem verdade que o estado de espírito influencia bastante. Não é fácil receber ao mesmo tempo o peso do céu e lidar com uma alma cinzenta. (Nada contra a cor cinza. Mas ela expressa bem o peso do que é a monotonia, o cansaço, a dor amortecida.)
Ele ainda não aprendera a lidar com a pressão, de fato. Mesmo tendo nascido em Brasília – o que poderia, a princípio, lhe conferir certa habilidade nisso, a realidade do céu não é uma percepção nata, nem conferida àqueles que nascem em determinada região; ao contrário, é uma lição que só se aprende depois de um tempo, quando já não se é mais criança, quando se desperta para a necessidade de controlar a pressão do céu nos pulmões e na mente. Há pessoas que despertam antes, outras, depois, como é o caso dele.
O fato é que até se perceber a necessidade de controlar a pressão, isso ocorre de maneira natural. Por isso as crianças não sentem o céu cinzento, nem trabalham, nem têm vertigens, nem a alma cinza. Elas ainda não perceberam a necessidade de controlar a pressão entre uma segunda-feira e um sábado. Simplesmente vivem o dia presente.
No entanto, quando se desperta para esse controle infeliz, não se pode voltar atrás. Fica instituído, dolorosamente, um novo tempo. O céu fica cinza mais vezes, é necessário trabalhar, se tem vertigens, a alma tende a ficar cinzenta também.
[Continua...]

Nenhum comentário:

Postar um comentário